26.1.11

CRUELDADE AMOROSA

recebi da minha amiga Fernanda o artigo polemico que saiu no jornal americano sobre o modo durão de uma mãe chinesa criar suas filhas, preparando-as para uma vida bem sucedida:

“1) as tarefas de escola sempre vêm em primeiro lugar; 2) 9 é uma nota ruim; 3) seus filhos precisam estar dois anos à frente de seus colegas de classe em matemática; 4) não se deve nunca elogiar seu filho em público; 5) se seu filho discordar de um professor, você deve ficar sempre do lado do professor; 6) seus filhos devem ser autorizados a fazer apenas atividades em que algum dia possam ganhar uma medalha; e 7) essa medalha tem de ser de ouro”.

A história a seguir é um exemplo da firmeza da mãe tigre (Amy, a mãe chinesa) para ensinar sua filha mais nova, Louisa, a Lulu, a tocar uma música difícil no piano. Lulu tinha cerca de 7 anos, ainda estava tocando dois instrumentos, piano e violino, e estudava uma música que exigia ritmos diferentes em cada uma das mãos. Amy trabalhou com Lulu sem parar por uma semana, sem sucesso, até a garota declarar que havia desistido. As duas brigaram, e Lulu rasgou a partitura. Amy a colou e a pôs num plástico, para evitar que a filha a rasgasse de novo. Passou a usar ameaças diversas, inclusive doar seus brinquedos. Não adiantou. “Quando ela continuou tocando a música errada, eu lhe disse para parar de ser preguiçosa, covarde, auto indulgente e patética.”
Nesse ponto, Jed Rubenfeld, o marido de Amy, de origem judaica, questionou se os insultos e as ameaças ajudariam Lulu a tocar. “Talvez ela apenas ainda não tivesse coordenação suficiente para aquela música". Amy disse que acreditava na filha e não desistiria. “Estou disposta a dedicar tanto tempo quanto for necessário.”
Depois de longas horas de exercícios e brigas, como por mágica Lulu de repente conseguiu tocar a peça. “Mamãe, olhe – é fácil!” E não queria mais sair do piano. “Naquela noite, Lulu veio dormir na minha cama, e nos aconchegamos e nos abraçamos, apertando uma à outra”, diz Amy. “Como pais, uma das piores coisas que você pode fazer para a auto estima de seu filho é deixá-lo desistir.”


estou longe de criar meus filhos a moda chinesa, porém sou adepta as qualidades da crueldade.
antes explico que crueldade não é maldade, muito pelo contrario; a crueldade real está recheada de amor e confiança na natureza e na vida.

nietzsche escreveu: crueldade é quando o amigo se aproxima pedindo apoio pois tem uma perna machucada, e o amigo verdadeiro chuta a perna boa.

o que pensa um cara desses quando escreve isso? que o amigo, tão amado, não merece uma ação de piedade onde colocaria o amigo machucado em um lugar inferior e dependente, e sim que o amigo é nobre e cheio de condições de afirmar o acontecimento, e encarar o machucado em sua perna como uma provocação, e quem sabe um presente para aumentar suas percepções da vida e de si mesmo.

falar não para um filho é um ato de crueldade. é um ato de amor. assim também como pode ser dizer sim!

fazer o filho perceber que seu corpo pode sofrer, sua alma pode se angustiar, sua mente pode se confundir, mas o que ele tem de mais forte é a capacidade de reencontrar seu alinhamento, suas conexões primordiais, o desejo de sua potencia, e por isso o desequilíbrio é tão importante pois nos da a oportunidade de recriar, reencontrar nossas conexões, criando condição de evolução e aumento de potencia.

o truque é exercitar a crueldade a serviço da potencia, e não a serviço do poder.
o exercício não é conquistar poder e controle sobre o filho, não é educa-lo para uma realidade dura, não é perder a paciência e desabafar sobre o mais "frágil".

quando se diz não a um filho, a pergunta que está por traz é: estou dizendo não porque não quero perder o controle? Porque não confio nele? Porque não tenho tempo para dedicar-me a ele agora? Por habito?

assim vamos entendendo que também podemos dizer sim por piedade.
dizemos sim por preguiça, para não ter trabalho, por falta de tempo, porque o filho vai sofrer, vai chorar...

não tem saída, para nos responsabilizarmos pela educação de nossos filhos é preciso muito trabalho em nós mesmos.
nos escutarmos, nos questionarmos, nos aprimorarmos.

sair da piedade carregada de ódio (ódio pela vida, pelos acontecimentos, pela incerteza) e aprendermos a crueldade carregada de amor (amor pela vida, pelo acontecimento, pela incerteza).

não me parece que a firmeza da mãe tigre Amy, a chinesa, seja um ato de crueldade amorosa a serviço do desenvolvimento da potencia de suas filhas, porque ela revela que está preparando suas filhas para serem campeãs, conquistadoras de medalhas (reconhecimento), mulheres de sucesso, que preenchem exatamente o lugar em uma sociedade desqualificadora da vida espera.

mulheres que provavelmente conhecerão o sucesso colado a solidão, as conquistas cheia de vazio, o amor impaciente, e talvez chegarão a perguntar, pra que todo esse esforço? O que realmente eu conquistei?

afinarmos nossas percepções, e exercitar nosso pensamento, para escolher dizer sim ou não, mesmo que pareça cruel, porem a serviço do desenvolvimento da criança, do fortalecimento de sua potencia, do amor a vida ativa e aos seus acontecimentos.

a mãe tigresa cria suas filhas para alimentarem o sistema desqualificador da vida, mães crueis criam seus filhos, e a si mesmas, para a vida!

5.1.11

EQUILIBRIO OU CONTRADIÇÃO?

inicio de ano escuta-se com mais frequência sobre tentar viver de modo mais equilibrado.

mas quando escutamos com mais atenção percebemos que ao invés de uma vida equilibrada, a busca é por compensações.

continua-se com o mesmo modo de vida, os mesmos valores, os mesmos objetivos, os mesmos pensamentos, porem com praticas que da a sensação de nos aproximarmos da natureza da vida.

todas as praticas alternativas acabam funcionando de forma paliativa; não há transformação, só compensação.

assim como tirar férias um mês por ano; trabalhar a vida toda para poder se aposentar; fazer primeiro as obrigações para então dedicar-se ao prazer; garantir um emprego seguro para depois pensar em atender aquele desejo enorme de fazer algo que não é considerado no mercado de trabalho.

será que da para chamar isso de equilíbrio?

ou seria mais pertinente chamar isso de contradições de nosso modo de vida!

vivemos distantes de nossa natureza corporal, potencial e social.

nosso corpo tem suas leis próprias, mas nossas ações não a percebem mais, pois colapsamos nossa coluna que nos sustenta, enrijecemos nossas articulações e fixamos, através de hábitos, o que deveria estar em constante transformação.

ao invés de desenvolvermos nossas potencias, servimos a um sistema que nos determina de fora.

vivemos socialmente fora da vida comunitária.

e assim seguimos, completamente afastados de nós mesmos e mergulhando em vivência que nos da a falsa sensação de transformação.

me faz lembrar do dia em que procurei uma grande pianista que também dava aulas de piano, disse que tinha um filho de 9 anos com facilidade musical e que gostaria que ele tivesse aulas com ela; muito calejada ela me respondeu que não dava mais aulas para crianças ou adolescentes, para ser seu aluno a pessoa deveria ir as aulas por decisão própria e que não dependesse mais de um adulto; e me explicou o quão frustrante era ver uma criança super envolvida com a musica decidida a seguir a carreira de musico, para desespero dos pais, que diziam que já era hora de parar com a musica para poder pensar em uma profissão de verdade que pudesse garantir o futuro.

assim agem os adultos em relação as crianças, da mesma forma que os adultos tratam seus próprios sonhos e desejos.

para compensar nosso afastamento de nossa natureza, nos envolvemos em rituais, praticas, vivências que com suas alegorias nos faz sentir um pouco mais dedicados a nós mesmos e a capacidade de ser parte de uma natureza.

se precisamos de algo para nos aproximar da sensação da vida é porque estamos vivendo bem longe dela.

a transmutação nos convida a transformar o modo que vemos, sentimos e agimos na vida.

uma mudança radical, mas extremamente necessária para sair desse ciclo esquisofrenico que vivemos.

reencontrar a potencia do corpo, do pensamento e do desejo.

parar de acreditar que a desconexão que vivemos no dia a dia é normal.

nosso sistema educacional é absurdo, nossas relações sociais são limitadissimas, nosso modo alimentar é critico, nossa capacidade de dedicarmos uma vida a um trabalho que nos distancia de nós mesmos é doentil.

enquanto isso a gente vai se enganando com ingenuos desejos de feliz ano novo!

transmutemos, então todos os dias serão intensamente alegres e necessários!!!