20.10.10

VIVA A DIFERENÇA!

a cena é essa:
as crianças estão em uma festa brincando e o pai ouve sua filha chorando, ele prontamente vai ao socorro da filha e tenta entender o que a faz chorar; magoadissima ela explica: "a gente tava brincando de pega-pega e aquela menina só fica tentando me pegar!" o pai não consegue escutar realmente o que a filha está dizendo porque está comovido por ver sua filha magoada, então sua reação é dizer para filha ir la e dizer para a outra menina "eu não gostei do que você fez!!!" a menina toma coragem, pede que o pai a acompanhe e grita o seu recado; ela fica meio confusa sem saber se aquilo gerou algo na "inimiga", e gruda no pai pois não tem clima para voltar a brincar imediatamente.

vi essa cena enumeras vezes, entre irmãos, amigos, colegas de escola, e muitas vezes com um adulto interferindo dessa mesma maneira.

depois me peguei fazendo essa mesma cena para resolver uma briga entre as minhas filhas, e comecei a desconfiar que com esse tipo de atitude, nós adultos ensinamos a criança a responsabilizar o outro pelos seus sentimentos, e apesar de não ser uma pratica fácil, todo mundo sabe que o único responsável pelos próprios sentimentos é aquele que os sentem.

em tempos de politicamente correto, ao invés de dizer para a criança "apanhou do amigo? bate de volta!", hoje a criança escuta: "não gostou do que o amigo fez? vai la e diz pra ele que não gostou!"

a criança se frustra com a atitude da outra criança porque elas pensam, sentem e agem de modo diferente!
porém é na diferença que a gente cresce; a igualdade acomoda.

enfrentar as diferenças tem sido uma pratica em desuso, porem são as diferenças que mexem na nossa zona de conforto liberando nosso desenvolvimento.

estamos sendo estimulados a nos unir aos iguais e evitar os que pensam, agem e sentem de modo diferente do nosso, e quando esse confronto é inevitável, nos sentimos incomodados e nossa primeira reação é querer desqualificar o "diferente", e assim vamos perpetuando nossos limites.

na escola as crianças se dividem em turmas onde o pré-requisito para participar do grupinho é "ser igual", e a escola acha isso normal e não investe em dinâmicas para que as crianças desde sempre enfrentem, aprendam e cresçam com as diferenças, não é uma questão de tolerar a diferença, mas aprender na diferença.

assim como os pais quando vem seus filhos em dificuldades tentam resolver desperdiçando a oportunidade da criança entrar em contato com seus sentimentos e entender (sem intelectualismos) que o que ela sente está nas mãos dela e não depende do outro.

claro que o outro pode tomar conhecimento dos nossos sentimentos, e o porque sentimos aquilo, mas o desenvolvimento é justamente entrar em contato com nossas dificuldades e aprender mais sobre nós mesmos, nossos sentimentos, nossas necessidades não atendidas, e supera-las construindo novos horizontes.

fiquei torcendo para que minhas filhas tivessem algum tipo de desentendimento e me chamassem para ajudar, para então experimentar outra atitude.

não demorou muito e ouço as duas chorando:

eu: o que aconteceu?
a mais velha (4anos): eu tava brincando com a boneca e ela pegou falando que a filha é dela!
a mais nova (2anos): ela me bateu! (bateu porque a irmã já aprendeu a revidar sua frustração no outro)
eu: as duas estão tristes?
mais velha: pede pra ela me devolver a boneca!
eu: perguntei se você está triste!
ela: estou!
eu: por que?
ela: porque eu quero brincar!
eu para a mais nova: e você está triste porque?
ela: porque eu quero brincar!

silencio

a mais velha: você quer ser a tia da minha boneca e me ajudar a cuidar dela?
a pequena: sim!

e foram brincar juntas!

4 comentários:

Beco do Restaurador disse...

fantástico, vou experimentar comigo mesma, e se tiver oportunidade com meus netos. ...ao saber que o outro tem um sentimento igual ou semelhante ao seu, desperta a compaixão e nos faz solidário

Pauleca disse...

Sensacional!!!!! juro que vou tentar, ta? rsrs....

Juru disse...

Simples...mas surpreendente.
Alias, como tudo o que eh simples, teimamos em sempre achar que o simples eh mais dificil do que realmente parece.
Obrigada Ana.

marta! disse...

Que lindo!!!
Sou professora e enfrento essas situações todos os dias! Vou tentar sair do automático e criar oportunidades de aprendizado durante as desavenças!